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O fundo de garantia por tempo de serviço – FGTS foi criado em 1966 em substituição à estabilidade decenal. O Objetivo é permitir ao empregado se manter até que encontre nova fonte de renda e indenizá-lo pelo tempo de serviço prestado.
Em geral, o trabalhador não tem acesso a esse valor até que seja demitido sem justa causa, exceto em alguns casos que a lei permite o saque, tais como: doença grave, calamidade pública, financiamento de casa própria, dentre outros.
Portanto, pode-se concluir que a liberação do FGTS é condicionada a momentos de vulnerabilidade do empregado, é uma saída para a dificuldade em que está passando.
Dessa forma, obstar o saque total do FGTS em meio a pandemia e de todos os prejuízos decorrente dela é ofender o fundamento de sua criação e o objetivo a que se destina, qual seja, a ajuda ao empregado quando ele mais precisa.
Diante desta tese, resolvi pesquisar qual o entendimento dos Tribunais e fazer um compilado disso.
De antemão, informo que transcrevo apenas os julgados que coadunam com o meu entendimento, ou seja, com a possibilidade e direito do trabalhador em levantar o valor total do seu FGTS.
> Falando nisso, será de grande valia a sua opinião nos comentários abaixo.
1) Jurisprudência STJ:
Em 2011 o STJ, em vários julgados, já havia se posicionado no sentido que o rol do artigo 20 da lei 8.036/90 é meramente exemplificativo, devendo apenas se observar o fim social da norma.
Julgados:
REsp 1619868/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe 30/10/2017;
AgRg no RMS 34708/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/10/2011, DJe 19/10/2011;
AgRg no AREsp 10486/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2011, DJe 30/08/2011;
REsp 1251566/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/06/2011, DJe 14/06/2011;
AREsp 874453/SC (decisão monocrática), Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, julgado em 22/02/2018, DJe 26/02/2018;
REsp 1524063/SP (decisão monocrática), Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 15/06/2017, DJe 23/06/2017. (VIDE INFORMATIVO DE JURISPRUDÊNCIA N. 614)
2) Jurisprudência TRT’s
2.1) TRT-12
A 3ª Vara do trabalho de Lages, à luz do princípio da razoabilidade, utilizando o sentido de justiça, bem como no da proporcionalidade concedeu autorização a trabalhador para sacar integralmente o FGTS em razão da pandemia do coronavírus.
Não foi elemento essencial para a juíza a prova de real necessidade econômica do trabalhador, resguardando seu entendimento da legislação em vigor.
Fundamentou que o parágrafo único do artigo 1º da MP 927/2020 reconhece a pandemia como hipótese de força maior para fins trabalhistas, visto ser emergência de saúde pública.
Ademais, o inciso XVI do artigo 20 da Lei nº 8.036/1990 estabelece que o FGTS poderá ser liberado em caso de necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural, conforme disposto em regulamento.
A magistrada também reconheceu que as hipóteses que configuram desastre natural para o fim de liberação do FGTS contidas no artigo 2º do Decreto nº 5.113/2004 são exemplificativas.
Outro ponto de bastante relevância é que o art. 4º do Decreto nº 5.113/2004 limita o saque em até R$6.220,00, mas, diante da notória necessidade urgente do trabalhador em tempos de grave crise econômica e sanitária, a douta magistrada entendeu não ser razoável tal limitação.
Esta brilhante decisão foi em sede de Alvará judicial de n° 0001570-79.2020.5.12.0060
2.2) TRT-1
Em sede de recurso no processo n° 0101212-53.2018.5.01.0043 a desembargadora entendeu que a liberação do FGTS não prejudica qualquer direito da reclamada, autorizando expedição de alvará ao autor para saque do montante depositado em sua conta vinculada de FGTS.
Ainda, a desembargadora assegurou que o fundo de garantia “é direito dos trabalhadores, nos termos do art. 7º, III, da Constituição Federal; que o art. 20, XVI, alínea a, da Lei 8.036/90 autoriza a movimentação da conta de FGTS dos trabalhadores residentes em áreas de calamidade pública; que o Decreto Legislativo 6/20, reconhece o estado de calamidade pública decorrente da pandemia de coronavírus (Covid-19); que estão suspensas as sessões de julgamento neste Tribunal por conta desta mesma pandemia, impactando de forma negativa no tempo razoável do processo e, por fim, que a liberação do FGTS não prejudica qualquer direito da parte empregadora.”
No mesmo sentido ATOrd 0000358-33.2020.5.11.0001
2.3) TRT-23
O magistrado em sede de jurisdição voluntária AlvJud 0000259-15.2020.5.23.0006, destacou que é necessário analisar cada caso concreto a fim de verificar que o trabalhador e sua família necessitem de apoio financeiro urgente, sopesando a garantia dos direitos fundamentais do trabalhador.
Além disso, o magistrado concluiu que o artigo 20 da Lei nº 8.036/90 não traz um rol taxativo de situações em que é possível se autorizar o saque imediato do depósitos fundiários, mas sim meramente exemplificativo, solidificando ainda mais seu entendimento no julgamento do STJ, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. FGTS. UTILIZAÇÃO DO SALDO PARA SITUAÇÃO NÃO PREVISTA NO ART. 20 DA LEI Nº 20.039/90. POSSIBILIDADE. 2. É possível o saque do FGTS mesmo nos casos não previstos no art. 20 da Lei 8.036/90, tendo em vista que o rol de hipóteses ali apresentadas não é taxativo, devendo prevalecer o fim social da norma. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 10.486/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2011, DJe 30/08/2011) (grifei)
Outro ponto destacado, acertadamente, é que o Brasil criou a Classificação e Codificação Brasileira de Desastres (COBRADE), no Anexo V da Instrução Normativa (IN) nº 02/2016, do extinto Ministério da Integração Nacional e atual Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), classificando os “ desastres biológicos por epidemias de doenças infecciosas causadas por vírus” como “desastres naturais”.
3) Jurisprudência JEF-RJ
O juiz federal em julgamento do processo 5022357-16.2020.4.02.5101 autorizou o saque do FGTS, pois entendeu que há permissão para o seu levantamento quando a parte autora estiver financeiramente impossibilitada de prover o seu próprio sustento e de sua família.
Ademais, a pandemia, por interpretação extensiva, faz parte do rol de desastre natural no artigo 20, XVI da Lei nº 8.036/90 e que é de conhecimento comum que o Poder Público, em todas as esferas federativas, decretou calamidade pública em virtude da pandemia do coronavírus, como se depreende do Decreto Federal nº 13982 de 2/4/2020, referendado pelo Decreto Legislativo Federal n. 6 de 2020, do Decreto do Estado do Rio de Janeiro nº 46984 de 20/3/2020 e do Decreto do Município do Rio de Janeiro nº 47355 de 8/4/2020.
O magistrado fundamentou ainda que “não só o STJ, mas a maioria dos tribunais pelo país, vêm determinando o saque do FGTS quando o trabalhador passa por necessidades financeiras, mesmo em situações não abarcadas na lei do FGTS. Isso porque não é razoável acreditar que a lista elaborada pelo Legislativo consiga abarcar todas as situações fáticas urgentes em que o trabalhador e sua família necessitem de apoio financeiro.”
Conclusão
Percebe-se que a legislação não deixa dúvida que a pandemia a qual estamos vivendo é elemento suficiente para assegurar ao trabalhador o saque total do FGTS. Ademais, mesmo se assim não fosse, todo jurista sabe que quando a sociedade muda, o direito tem que mudar e que não há lacuna no Direito, pois este não é feito apenas por leis.
Se verifica também, a ações estão sendo distribuídas perante a Justiça Trabalhista e Federal e em ambas a competência não é discutida.
Mas fique de olho! a possibilidade de deferimento do pleito na esfera trabalhista é muito maior.
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